Fiquei tanto tempo sem escrever. Vida muito dura aqui fora, texto tava difícil de sair. Mas hoje vai um pequeno.
Eu queria era falar dos meninos. Da educação de meninos. E isso se conecta diretamente com as violências sutis já mencionadas.
Ah, como é difícil. Lembro da Flavia Castro adolescente, no lindo "Diário de uma Busca" (sobre o qual ainda vou escrever, mas tô respirando para), dizendo que não queria voltar para o Brasil e que os homens aqui eram muito machistas.
Não só os homens, Flavinha. O mundo aqui é muito machista.
Eu, mãe de meninos, me deparo tão frequentemente com a reprovação de mulheres: "você vai deixar ele levar o prato? É tão pequenininho"... "ah, deixa que eu faço pra ele".... "menos, Renata, menos".
Sou muito feliz com os meninos: tão se tornando pessoas legais, acho. Olham pro outro. Escutam. Tentam entender.
As pessoas notam e acham que eles brotaram assim. Engraçado. Não brotaram. Eles têm suas qualidades. Mas eu educo, todo dia, toda hora. E reivindico minha parte nisso. Com força. Porque enquanto as pessoas acharem que meus filhos são legais porque brotaram assim, não se discutirá o fundamental: a parte que a educação - e aqui falo de educação "sutil", ou seja, de cultura familiar, conversas e exemplos - tem nisso.
Quando o João tinha uns 4 ou 5 anos comprei pra ele lindo livrinho (sugerido, aliás, pela Flavia) dos pinguins Gus e Waldo, que vivem história de amor. Lindo mesmo o livro. Desenhos incríveis, e uma historinha delicada.Fui reprovada por quase 100% do mundo.
Fiquei chocada, juro.
Agora circula pelas redes uma conversa de "se você for a favor dos direitos homossexuais seu filho não se tornará gay", uma palavra de ordem. Isso é fácil de colar no mural, galera. Quero ver vocês darem o livrinho pros seus filhos pequenos. Quero ver vocês me deixarem dar panelinhas de presente para um menino que gosta delas. Quero ver vocês, como uma amiga minha de coragem, deixarem os meninos brincarem de Barbie.
Porque é aí que começa tudo: as meninas sonham com vestidos de princesas e com o beijo do príncipe. Os meninos...tadinhos. Dão pra eles bolas, armas, carros. Carros. Caraca. Que coisa mais sem graça. Eu acho. Armas. Aqui em casa era vetado. Mas é comum, né. Bolas. Ok. Mas porque não cordas de pular, elásticos? Porque não bonecas? Tantos meninos gostam de bonecas. É tão legal brincar disso. Cuidar. Botar no colo. Fazer carinho. Isso sim é educar um menino pra ele não ser machista. Pra ser um pai bacana. Pra ser feliz como ele quiser ser.
Quando Felipe tava crescendo, eu vi o assédio que ele sofria: os homens só se aproximavam dele com "brincadeiras de homem" - socos ou futebol. Pro meu filho lindo e artista. Que gostava (e gosta) de ler e de desenhar. Que contava histórias tão lindamente. Eu vi o desconforto de tantos homens com o menino que não era "padrão". E fiquei chocada, de novo.
Felipe cresceu, e continua gostando de artes, gostando de ler. Gosta, também, de outras coisas, "de menino". João tá crescendo, e agora é que está começando a gostar dos livros. Gosta de desenhar, apesar de se sentir meio oprimido pelos desenhos incríveis do irmão. Mas isso passa. Gosta de futebol. E gosta também, tanto, de bebês.
(todos dois gostam de novelas, devo dizer. Eu, noveleira desde sempre, criei companhia pra assistir comigo. Novelas são também ótimo espaço para discussão de temas espinhosos. E já usei várias vezes. A gente aproveita a cena e comenta. Melhor do que tirar o assunto do nada).
Tomara que eles sejam felizes; claro, a gente sempre deseja. Mas ser feliz é movimento: não é estado. Ser feliz, pra mim, é se sentir vivo: vivo, na vida. Indo, andando. Descobrindo. Não se encolhendo. Não com medo. Não tentando corresponder a uma estreita e congelada imagem do que é "ser homem". Tomara que eles sejam eles. Muito eles. Com confiança de que dá pra ser.
Dá pra ser, gente. É mais difícil - é, como diz o outro, "o caminho menos percorrido". Mas dá pra ser. A gente escolhe, a gente encara. A gente descobre outros. Que tão juntos e que ajudam na caminhada. Que é mais difícil, mas também mais saborosa. Mais encantadora. Mais amorosa.
Dá brilho no olho e vontade de ir mais. "Ao infinito e além." Bora?