Eu não ia dizer nada sobre isso. Quer dizer, nada além do que já disse: que achava um acinte um evento desse porte ser realizado em pleno horário do rush, no centro do Rio, que já está totalmente bagunçado pelas obras. Que achava falta de respeito com quem tem que voltar pra casa do trabalho. Que, sim, achava que a Preta Gil podia fazer o casamento que quisesse, do tamanho e do jeito que quisesse. Mas que acharia muito mais bacana se ela tivesse optado, por exemplo, por fazer no final de semana, que não atrapalharia o povo na volta do trabalho.
Aí comecei a ver comentários: alguns de revistas de celebridades, falando da pompa da festa, comentando vestidos, padrinhos etc. Acho divertido ler essas coisas sempre. E nem preciso estar na depilação. Aí teve o texto do André Forastieri - com quem, em geral, eu não concordo - falando sobre o custo do casamento: achei apropriado. Uma pessoa pública. Um evento daquele tamanho. Uma família que, originalmente, era de classe média. Um pai que foi ministro da cultura. Por que não falar dos custos? Por que não discutir dinheiro de cultura? Foi alfinetada? Sem dúvida. Mas é papel de jornalista. Achei válido.
E depois vieram aqueles “em defesa” da Preta Gil - como se ela precisasse disso. E o que vi foi tudo na linha “só falaram dela porque ela é negra e gorda e tem quarenta anos e é tudo recalque”.
Só isso que me tirou daqui do meu cantinho pra escrever algo a respeito: porque, não, não é isso. Não, não é porque ela é negra. Não, não é porque ela é gorda e tem quarenta anos. E isso me lembrou muito certas “defesas” do partido hoje no poder. Essa conversa de que qualquer crítica é recalque - ou, no caso, racismo, gordofobia e similares.
Bora parar com isso, gente. A Preta Gil é ela: uma mulher bem-sucedida, que faz a vida dela, que samba na cara dos preconceitos e, sim, ostenta quando tem vontade. Tá certíssima ela. Eu, aliás, sempre simpatizei imenso com esse lado da Preta. Bota mais pérola que tá pouco, aumenta o decote, joga glitter, tá tudo lindo e eu não tenho nada a ver com isso.
Mas tenho a ver com a discussão de dinheiro público que pode estar envolvida aí. E se não estiver, tanto melhor: mas o questionamento não deixa de ser válido e apropriado. Tenho a ver, também, com o simbólico do evento (já que eu tenho a sorte de não trabalhar mais na cidade e nem moro em Santa Teresa, e portanto de não fui atingida diretamente pelo megaevento VIP-VIP que arrasou o Rio de Janeiro na terça passada): acho bem triste mesmo que não haja nenhuma gotinha de espírito cívico na pessoa ou em seus familiares, que ninguém tenha se preocupado com o tamanho do caos que iria causar. E acho, sim, que isso tem que ser discutido. Em si. E todo dia. Não pode, Arnaldo. Sinto muito: se pode, não devia poder. Tá muito errado. E fico triste também pelo simbólico da coisa: de Gil, de seus filhos, eu esperaria outra coisa.
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