quarta-feira, 25 de maio de 2016

Genebra, Paris, Cambridge, Roma

Olha o título do post.
Agora pensa sobre isso: o que te vem à cabeça em primeiro lugar?

Na minha experiência, o que você está pensando deve ter algo a ver com "circuito Elizabeth Arden", com jet-set, com sofisticação, com grana.... se você já leu Sabrinas e Julias, se você for meio sonhadora, aí é que brilham os olhos e você já está imaginando aquele estrangeiro elegante, bem vestido, embora meio desleixado, que segura seu braço e olha fundo nos seus olhos até suas pernas virarem geleia e seu coração começar a bater descompassado.

Volta. Rebobina.

Agora acompanha aqui:

Genebra - onde eu fui morar com menos de oito anos, e portanto bem  antes de ter alguma ideia de Suíça na cabeça. Te digo o que vem à minha: a cidade pequena e tranquila em que as crianças começavam cedo a andar sozinhas, a beira do lago onde a gente ia passear e tomar sorvete de casquinha, o Dino e suas massas maravilhosas e reconfortantes, minha escola pública antiguinha com fonte no meio, minha segunda escola pública recém-construída com escultura de madeira no meio, pátio que emendava com o prédio vizinho e o porteiro/faxineiro Patrick, gente boa, que ensinava a gente a jogar basquete.... as roupas eram compradas em C&A ou nos brechós, porque era prático e barato e era o que todo mundo à nossa volta fazia. As "promotions", em que todas as escolas primárias públicas da cidade desfilavam, no final do ano, com a população de pais toda na rua, assistindo e batendo palma. Era assim, cada turma com seu professor ou professora. E eu só conhecia uma escola particular ali: a Escola Internacional, onde estudavam filhos de diplomatas, de funcionários de organismos internacionais e meu amigo Zuza. Meus amigos imigrantes de segunda geração: nascidos ali, não tinham nacionalidade suíça e sim a do seu país de origem - basicamente Itália e Espanha. 

Paris - Paris era a cidade-irmã, como aqui no Rio é São Paulo. Em Paris moravam meus primos, a gente ia de trem e demorava umas seis horas, tinha a casa de tia Sônia, a gente passava feriados curtos, tinha os museus que eu adorava (o Musée de L'Homme, a Cité des Sciences et de l'Industrie), tinha os cafés e os restaurantes de comida árabe, o Beaubourg. E, até hoje, nunca entrei no Louvre. Tinha Montmartre e seus desenhistas na rua. E as crêpes. Nazaré Pereira cantando no Jazz O' Brazil, que ficava no Quartier Latin. Tinha as lembranças dos meus pais de logo depois do casamento, contadas aos pouquinhos, andando pela rua.
E eu nunca fui lá depois que tio Sylvio morreu. Acho que vou chorar. Se for.

Cambridge - Lá eu morei sem ter morado, meio que na aba de doutorado de namorado, mas é como se. Por alguns meses, mas com apê, com bicicleta, e assistindo aula na universidade. Frequentando o St Edmund's College, que era o único católico. Os pubs tantos. A mercearia Nasreen Dar onde fazia compras e achava graça na arrumação que mudava toda semana. A biblioteca da universidade, os colleges onde o Keynes, onde o Sraffa.... o restaurante grego, os cafés descolados do povo da universidade. Os kebabs do Oasis. Punting no Granta. Eu andando na minha bicicleta rosa pelos commons, aqueles parques comunitários em que um dia os camponeses levavam os animais para pastar, e cantando em altos brados ao som da fita de Simon & Garfunkel que o Marc tinha me dado. O english breakfast com feijão doce (e eu gostava). A double feature inesquecível no cineclube do King's College: The Holy Grail do Monty Python seguida de Top Gun. O povo já vinha embalado do Monty Python, e viu o segundo filme como se fosse comédia. Acho que nunca ri tanto na vida.
A nossa festa de divórcio, que era meio de brincadeira mas não era, quando voltei pro Brasil.

Roma -  Outra cidade que adquiri pela via dos pais-nômades. Adquiri, incorporei e amei. Roma, que saudade. Mais uma vez o walkman, dessa vez com músicas brasileiras que o Zuza tinha me dado de presente na festa de despedida. Não era mesmo uma despedida, ia ficar só alguns meses, aproveitando que estava escrevendo a dissertação de mestrado. Roma é a cor ocre, rosa, o pôr-do-sol quando a cidade toda se ilumina. Os restaurantes que papai descobria, os menores, os de cara mais vagabunda, e adorava apresentar. Aquele do Campo dei Fiori. Aquele em que tinha rodízio de massas e frutos do mar, perto de casa. A casa: Garbatella, o bairro mais lindo e mais aconchegante. Longe do centro, no fim da linha do metrô. Garbatella sem supermercados (que lá só são permitidos fora do perímetro urbano): as lojinhas, uma ao lado da outra - verdureiro, formaggeria, salumeria, padaria... cada uma mais bonitinha que a outra. Era uma alegria fazer compras em Garbatella. O terraço da FAO onde eu ia estudar olhando pras Terme di Caracalla, ajudada por um capucino em que o rapaz desenhava um coração de espuma. Todo dia. E sorria. O idioma italiano, o mais lindo. Que dá vontade de guardar na boca, de rolar na língua. De enrolar na língua, né, porque falar mesmo não era o caso: mas a gente se entendia. Eu e os italianos, digo.
Até mais ver, Roma. Saudade.






16 comentários:

  1. nunca entrou no louvre? alguma razão mais profunda?

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    1. preguiça das filas... e de museu grande. mas gosto da pirãmide. :)

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  2. Roma é muito legal. Fui duas vezes e se pudesse não parava de ir...

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  3. Vou brincar de lembrar: Passei um dia totalmente delícia com os meus na Cité des Sciences et de l'Industrie. Por alguma razão, lendo seu post me surpreendi de ele estar lá há tanto tempo. Como se por ser tão modernoso fosse necessariamente novo. Boba, eu.

    De Cambridge, a lembrança mais doce é eu deitada na grama ao lado de uma amiga compartilhando o headphone e ouvindo o CD do Smashing Pumpkings que comprei numa banca instalada por ali em algum pátio daqueles. O céu, o café, a idade do nosso mundo ocidental. Thanks for making me remember. <3

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    1. que lindo, Rita. Thanks for making me remember é tipo o que eu queria com esse post....
      E é rosa, né, Tina... Rosa e linda.

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  4. Voce ficou direto na Europa ( na infancia) ateh que idade?

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  5. o italiano na ponta da língua <--- eu apoio ;-)

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  6. O que vem à cabeça em primeiro lugar? "Melhor não ler pra não morrer de inveja". Mas li. Ainda bem. Que delicia de post, que riqueza de lembranças. ❤️

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    1. Hahaha Angélica, adorei o comentário. Esse é daqueles que não é tão fácil escrever, por vários motivos. Um deles é esse aí.
      Mas já aprendi que é assim, "a dor é minha, o samba é meu".... fazer o quê. Beijos!

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  7. ah, que delicia!! tantas historias... a gente só lembra assim, tantos anos depois, quando a experiencia marcou mesmo, lá no fundo...
    você é que devia escrever um livro, sabia?
    beijos, gosto muito de você!

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