E hoje é "o livro favorito da sua infância". Que, evidentemente, vou transformar em "um livro"... porque "o" não tem. Minha infância poderia se chamar "afogando em livros" (inspiração do Peter Greenaway, "afogando em números" - um filme que eu adoro, contraditoria e inesperadamente). Desde os cinco, afogada em livros. Quando eu chegava no Recife, nas férias, meu tio Paulo me botava pra ler. Tenho essa lembrança: eu lendo na frente de convidados dele. E não entendendo: porque eu, se todos os filhos dele já liam? Depois é que fui entender - era a idade. Mas na hora, não. Lia sem problemas. Até porque era tímida demais pra recusar.
E, vocês notaram, tô adiando o momento de dizer qual o livro.. porque até aqui ainda não decidi.
Poderia ser Pollyana - o primeiro que li sem imagens, e que deixou marcas fundas. Poderia ser outro Lobato, claro: O Minotauro, O Sítio do Picapau Amarelo, Reinações de Narizinho. Porque eles eram minha família adotada, qualquer um serviria. Eram meus amigos de infância, tão reais quanto os outros.
Mas não vou cair nessa facilidade. Vou falar de um cuja história é que eu tinha onze anos e a abertura - Abertura - já se anunciava: aí o Claudius, a Jo e meus pais começaram a se preocupar com o fato de que a gente ia prá escola no Brasil, daqui a pouco. E precisava ler mais em português. Então um dos que li nesse período foi "As Pupilas do Senhor Reitor". Português de Portugal....tantas palavras: raparigas, Desfolhada... escalda-pés... reitor, mesmo.
Guida e Clara, as irmãs. Uma sombria, uma luminosa. Anos e anos depois, quando fui escrever sobre "Mulheres em Touro e Escorpião" , a imagem taurina que me veio à mente foi a de Clara lavando roupa no riacho, os braços luzidios e roliços sendo olhados pelo seu enamorado (de quem não lembro o nome e não vou googlear). Acho que é nessa hora que ele se dá conta que está apaixonado. E eu sou taurina: imagens de trabalho e sensualidade juntas me calam fundo na alma.
Me encantei com As Pupilas, que li e reli como de hábito. E que deixaram marcas engraçadas na minha incerta grafia em português (como também A Moreninha, que li pelo mesmo motivo). A história de sofrimento e redenção de Margarida, por certo: mas sobretudo a atmosfera, a vila portuguesa onde se andava a pé, o caldo de galinha para os doentes, a festa da Desfolhada em que o milho era desfolhado pelos jovens, com cantos e danças.... muito depois, no Forum Social Mundial de Belém, ouvi de um "irreverendo" (como afetuosamente eram chamados os pastores "de trabalho", rosto queimado de sol e sotaque do interior, hospedados em casa de conhecido) uma história que me lembrou essa, de colheita coletiva em terras do Sul (Paraná? Rio Grande? Não lembro). De solidariedade, trabalho e alegria. Uma história que me toca, como tantas pequenas histórias, de gente simples, de gente. Porque eu gosto é de gente, gente.
Aaadorei o post. E sei que adorei A Moreninha, também. As Pupilas não li, mas gostei de você ter lido. :-)
ResponderExcluirGostei tanto de As Pupilas.
ExcluirQue acho que você ia gostar também...
Primeiro: uia, pelo menos uma pessoa que, como eu, tem certo afeto pela Pollyana. Segundo: eu gosto tanto do ritmo da língua quando no português de Portugal. è ao mesmo tempo íntimo e surpreendente.
ResponderExcluirLuuu! Como é que deixei aqui esse comentário sem resposta... sobre Pollyanna a gente já falou, né? <3
Excluirsaudades.