Sou leitora da Folhinha. É, a Folhinha. Do Sagrado Coração de Jesus. Meu avô comprava para todos os (oito) filhos, e minha mãe assumiu essa função. Compra pros irmãos, pra sobrinhos, pros filhos. E eu leio. À noite, antes de dormir. Uma preciosidade. Um almanaque descartável. Me diz as fases da lua. O nome dos santos do dia. As frutas e os legumes de cada época. Dá dicas de alimentação. De vida. Tem reflexões no verso da folhinha de cada dia. Na folhinha aprendi tanta coisa - por exemplo, que Tiago e Jacó são o mesmo nome: de Jacob ou Iacob para Iago para Santiago ou Santo Iago, para San Tiago... onde mais?
Foi na folhinha que li o seguinte texto, atribuído ao poeta Khalil Gibran: "O sofrimento nada mais é do que a dor que envolvia teu entendimento se quebrando".
Sei esse de cor. Preguei na cortiça perto do telefone, numa época em que havia cortiças e os telefones "ficavam" em algum lugar. Vocês não conhecem, mas já houve isso. A gente é que ia até o telefone. Enfim. Botei ali porque ali eu via todo dia, e quanto mais eu visse, lesse, repetisse como um mantra, quem sabe... quem sabe eu incorporava. Quem sabe aquilo passava a fazer parte de mim e parava de doer.
"Se o Jayminho passou, tudo passa", diz uma amiga minha. E incorporei essa também. Substitua o nome pelo de sua preferência. Uso em ocasiões variadas, para falar de assuntos diversos. Ajuda. Acalma. Afinal, se até o Jayminho passou...
Aí que o tema aqui é esse: a hora de largar mão. De desapegar. De deixar ir. Como diz o Khalil Gibran, dói porque a gente passa a entender algo que já tava ali, e que a gente fechava os olhos para não ver. De olhos fechados, os monstros são maiores. Na hora em que a gente abre, taí. Dói. É pauleira. Mas aí a gente já tá em movimento. Saiu da crispação. Da tentativa de cristalização de algo que já não era, que já não tava. Dói e pode doer pra cacete, mas dá um certo alívio também. Tem tamanho. Tem contornos. Enquanto a gente tá de olhos fechados, na modalidade "se eu não tô vendo não existe", aquilo que a gente não tá vendo - mas no fundo sabe que existe - tá em todas as partes. Envolve. Ameaça por todos os lados. Quando a gente abre os olhos, dói mais - mas já tá, de certa forma, posto que tá doendo menos. Porque, como diz o Ionesco, "o que tem que acabar já acabou".
Como quando a gente tá numa árvore: num galho lá em cima. E de repente, os pés se soltam. A gente fica pendurada, só pelas mãos. Num galho tão alto. Que susto. Que medo. E agora? Agora, amigo, não tem jeito. A árvore já se desapegou da gente: é hora da gente se desapegar da árvore. Soltar. Deixar o galho e se deixar cair. A árvore já era. É no chão que continua.
Que bordado lindo, Rê! De emocionar, de emocionar mesmo.Olhos cheios d'água. Beijão"
ResponderExcluir... e é um caminho difícil para uma taurina apegada, viu... a gente aprende isso todo dia! Beijos!
Excluirê, coisa bonita & bem escrita!!! pra repassar imediatamente. bj bj
ResponderExcluirEita, que alegria que você gostou... :)
ExcluirAchei supimpa.
ResponderExcluir"supimpa" é ótimo... :-)
ExcluirRenata, querida, com as folhinhas do Sagrado Coração você vai tecendo no chopinho sua árvorte de emoções e reflexões. Quem Bom !
ResponderExcluirsaudades de vinho com amigas
bjs martha
Viva, Marthinha! Que honra sua visita...! Vamos tomar vinho dia desses. Também tô com saudades.
ExcluirLindo demás! Texto primoroso! Beijo
ResponderExcluirLindo tu escrito. Me trajo mi curiosidad y portuñol amateur. Una belleza. No entendí todo pero sentí todo. Después el google. Quiero llorar. Mi hija adolescente: dejar partir, desapegar. Me desgarra, es verdad. También estoy en crecimiento, y duele. Mi hija que viene pronto. Que ambas crezcan libres. Que mi compañera actual también. No voy estorbar. Desapego. Gracias, Renata. Beso. @rgrijalba
ResponderExcluirque lindo o comentário. Só vi agora. E tão verdadeiro. Esse espaço, o dos filhos que crescem livres, é também espaço de desapego por excelência. É desafio, mas vale!
ExcluirDeliciosa, Renata.
ResponderExcluirbj
:-) Info essencial! Beijos!
ResponderExcluirCheguei agora na casa, através da amiga Borboleta (nos Olhos) e já me senti à vontade. Obrigada
ResponderExcluiradorei Renata.
ResponderExcluir(Lucinha)
Muito bom. “ é no chão que continua”. ��
ResponderExcluirPisando leve e firme, sigo no chão. Que beleza Rê!
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