Na minha escola pública em Genebra a gente tinha um fichário de textos, organizados por tema, no estilo "Para Gostar de Ler". Um cardápio-degustação, de certa forma. E fui atrás de muitos livros por conta daquele fichário.
O que está na minha cabeça hoje tem a ver com o texto de ontem sobre astrologia: e não sei nem de que livro foi tirado, nem o nome da autora. É um texto que nunca me saiu da cabeça, e que depois, bem depois, eu fui conectar com várias características associadas ao signo de Touro, que é meu signo solar. Acho que provavelmente já até escrevi a respeito: só não sei onde.
É um texto em primeira pessoa, de uma mulher adulta, que se lembra dos seus aniversários de infância e de uma tia sua, que, em vez de brinquedos, lhe dava sempre um talher pesado, de prata. Às vezes uma colher de servir ou outra. A narradora se lembra com pesar de como desprezava esse presente da tia, já mais velha e fora de moda. Preferia os brinquedos e bonecas dados de presente pelas outras tias, mais jovens e mais afeitas aos gostos infantis. Acaba o texto contando que todos aqueles brinquedos de que tanto gostara na infância agora tinham desaparecido: e no entanto, lá estava, reluzente, o faqueiro de prata, que tia Fulana tinha conseguido completar ao longo dos anos.
Esse texto me incomodava e me tocava: não gostava do desprezo velado que continha pelos brinquedos. Eu amava minhas bonecas, minha bicicleta, meus patins, teria odiado ganhar um talher de prata de aniversário... e no entanto não conseguia deixar de ficar tocada pelo esforço da tia Fulana, de ofertar algo durável, algo útil, algo que servisse para a vida da amada e ingrata sobrinha. Durável. Útil. Prático. Palavras tão taurinas. Touro, esse signo sem charme. Sem o brilho fugaz de Gêmeos, sem o encanto de Sagitário, sem a adorável confusão de Peixes. Sem o carisma de Escorpião, sem os maneirismos elegantes de Libra. Touro. Pesado. Denso. Estável. Fincado no chão de terra. Confiável.
O texto da tia Fulana era pra mim, claro. E eu não o reencontrarei nunca mais, já que não sei o título nem o nome da autora. Mas ele mora em mim para sempre. Ele e os talheres de prata. Têm sua beleza, os talheres de prata. Não para uma criança, mas para a adulta que essa criança se tornou. E, além de tudo, servem para alimentar-se: querem imagem mais taurina?
imagem daqui
vou precisar de um tempo maior do que o que tenho agora para comentar. mas já queria adiantar que li e <3
ResponderExcluirsim, emulando a tia Fulana, é necessário tempo... :)
ExcluirTalheres de prata. Sim, faz sentido.
ResponderExcluirnão faz?
Excluirachei graça de uma amiga minha que comentou no tuíter "eu sou a tia Fulana!" :)
"Touro, esse signo sem charme. Sem o brilho fugaz de Gêmeos, sem o encanto de Sagitário, sem a adorável confusão de Peixes. Sem o carisma de Escorpião, sem os maneirismos elegantes de Libra. Touro. Pesado. Denso. Estável. Fincado no chão de terra."
ResponderExcluirAinda bem que o "Confiável" entrou ali no finalzinho para amenizar o massacre. Confiável e que dará suporte aos amigos - sempre.
Gostei da tia. E nem se efetivamente gostaria mais dos brinquedos - embora só fosse reconhecer mesmo toda a utilidade da prata um pouco maior (acho que nem precisaria ser mesmo um adulto.
E sobre essas "escolhas estranhas" inciais, me lembro de um conto do Kalil Gibran. Um rei(?) vai sair em viagem e um dos escravos (?) escolhe o cesto das comidas - que era o maior e o mais pesado. Mas, com o transcorrer da viagem, todos a reclamarem do fato de estarem cansados de carregarem peso, o cesto dele ia ficando cada vez mais leve... então, o futuro pode trazer benesses. Ou um jantar com talheres de prata. eheheheheh
Isso.... a gente é de corrida de longa duração, Claudinho.... :) Ao longo da vida, o "confiável" vai aparecendo e se destacando. Não é de prima, mas a gente chega lá. Que nem os talheres da tia Fulana.
ExcluirAdoro o K. Gibran.
Eu gosto muito de taurinos, rs. :P
ResponderExcluir:) Muito me alegra saber disso!
ExcluirTambem ganhei esses talheres da minha madrinha ao longo de todos os natais e aniversarios...eram jogos unitarios,que hoje somam 14...E continuam aqui.Firmes e fortes,como tudo que perdura
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