O de hoje é "o livro mais assustador que você já leu". E pra esse não preciso nem pensar - é óbvio.
A cena foi meu aniversário de onze anos, um presente atrasado da minha amiga Françoise: dois livros. Um era "Marie Lumière", lindinho, sobre uma menina (Maria Luz) que ia conhecer o pai e conviver com ele pela primeira vez na vida.
O outro é a pauta aqui: "O caso dos dez negrinhos" (Dix petits nègres), da Agatha Christie. Meu primeiro Agatha Christie. Tão assustador que escondi o livro depois de tê-lo, fascinada e apavoradamente, devorado. E demorei um tempão até pegar meu segundo Agatha Christie - que foi, felizmente, Assassinato no Expresso do Oriente, a partir do qual minha carreira de agathachristeira começou e foi se solidificando ao longo da vida; mas isso é outro assunto.
"O caso dos dez negrinhos" é um livro assustador pela atmosfera. Uma ilha. Dez convidados. Que vão morrendo um a um. Sem que se saiba porque. Uma ilha sem anfitrião. Ilha já é assustador, né. Pelo isolamento. Uma ilha em áreas britânicas ainda tem, possivelmente, falésias de pedras negras e brumas. Nem lembro se essa tinha. Acho que nunca mais li o livro. Eu que leio e releio Agatha Christies como comfort books. Pra me confortar, pra me consolar e me fazer achar que tudo tem jeito. Como outros lêem livros de auto-ajuda, eu leio "Aventura em Bagdad", "O homem do terno marrom", os Miss Marple todos, os de Tommy e Tuppence Beresford. Poirot também, claro: mas sou mais Miss Marple e seu universo de Saint Mary Mead, as fofocas do vilarejo, a "natureza humana" que se reconhece nas pequenas coisas... dos livros de Poirot gosto é do alter-ego da autora, Ariadne Oliver, e seu detetive finlandês por conta do qual vivia recebendo cartas de reclamação dos leitores (e sempre imagino as cartas dos belgas à própria Agatha).
Nos "dez negrinhos" - que, por reclamações de editoras, já teve vários nomes e não sei mais qual o que está em voga atualmente -, não há personagem principal, não há esperança, não há saída. A atmosfera de angústia só piora ao longo do livro. Não é, definitivamente, um Agatha Christie característico. Só que foi meu primeiro: eu não sabia.
A história se fecha num posfácio explicativo. Pelo menos isso.
Eu sou uma viciada em Agatha. Tenho um monte, mais de sessenta tranquilamente, e revezo nas releituras. O meu primeiro foi "Cavalo Amarelo" (um dos menos legais), mas aí se fez feitiço e, pronto, fã. Tenho uma queda pelo Poirot, a arrogância dele é tão tocante...Também curto Miss Marple e sua adorável analogia com as poças d'água.
ResponderExcluirO Caso dos Dez Negrinhos é exatamente como você descreveu: angustiante. Eu li depois de mergulhada no estilo da AC e ficava perplexa: onde isso vai dar? porque não aparecia resposta, não aparecia caminho, só mais ansiedade.
Renata, baby, eu posso dizer que nem sei se gosto mais da sua estante ou da relação que você tem com ela?
Lu, essa estante aí é a da minha cabeça. Não é física. Tem vários livros por aqui que eu não sei por onde andam. E nenhuma vez fui olhar na estante antes de responder: meu jogo é interno, com os livros que tão em mim. Por isso, nem me importo com a verdade factual: o relevante é como os livros ficaram pra mim. O que deles ficou.
ResponderExcluirMas se vc pintar por aqui, já fica marcada uma apresentação à estante! A de verdade...
Eu também fiz meu desafio contando com minha memória e/ou afeto (geralmente os dois). Os meus eu sei onde estão: dentro de casa (acho). E nem se engane, eu ano o Rio, qualquer dia apareço e vou bater na sua estante, ops, porta.
ResponderExcluirE o livro perdeu o título; por questão do politicamente correto, e do preconceito na palavra "nigger", chama-se agora "E não sobrou nenhum" (And then there were none).
ResponderExcluirGostei muito desse livro quando o li na adolescência - por´me nunc amais voltei a ele, nem a "Cai o pano", "Os elefantes não esquecem" e "O assassinato de Roger Ackroyd", que foram outras das obras dela que li.
Abraços, Pádua